quarta-feira, 9 de abril de 2014

Samba de uma nota só

Há exatos treze meses não escrevo um texto. O último post deste blog foi em 06/03/13. Razões variadas, que não cabem no momento. O que interessa é o porquê deste texto, de voltar a escrever. Tenho lido e ouvido muitos delíreos. As redes sociais dizem muito. A mim desanimam bastante. A gota d´água  é o "alerta" de que caminhamos para um golpe comunista. Esquizofrênico! No mínimo.

Uma digressão: quando comecei a escrever, não raro compilava textos extensos. Geralmente enfadonhos, busquei ser mais conciso. Mas escrever não é fácil, quiçá a arte da concisão. Tenho dificuldade. Tentarei ser o mais objetivo possível na argumentação. No entanto, os fatos abordados tornarão inevitavelmente comprido este escrito.

Voltando ao início. A LER-QI está tramando um golpe institucional? Sério? Não! É o PT seu vetor, nos faz saber nossos probos humanos direitos. Quanto à atração nuclear PT - Comunismo, me recuso perder tempo com tal sandice, é muita indigência intelectual. Já com relação ao caráter golpista do PT, observações. Não há nenhum fato político e, sobretudo, institucional que permita tal divagação. Abusos existem, por certo. Mas estamos bem longe de qualquer possibilidade de ruptura do Estado Democrático de Direito. Em qualquer esfera federativa. Entretanto, se tem alguém que conclama abertamente em prol da fratura democrática, são os órfãos da ditadura, e não ditabranda, civil-militar 64-85, como visto em recente protesto. E com proteção do Estado. Na nossa triste ditadura, a oposição não recebia proteção do Estado, muito pelo contrário. Cheiro de pólvora se alastrava.
Mais. Se alguém foi vilipendiado, já no período pós ditadura, foi o PT. Trato das eleições presidenciais de 89. À época, o cheiro de queimado já se fazia sentir. Recentemente, as labaredas reacenderam. Diretores da Globo da época e, finalmente, o seu principal executivo, o conhecido "Boni", admitiram que o canal manipulou editorialmente o último debate eleitoral entre Lula e Collor, a dois dias do pleito, com o intuito de favorecer o segundo. Golpe branco, nada subliminar, pois. Emissoras de TV que, frise-se, são concessões públicas. Dentro da normalidade, cassação da concessão. 
Sufrágio de 1998. Mais precisamente 04/06/1997. Congresso Nacional aprova emenda constitucional que dá direito a uma reeleição aos titulares de cargo executivo. É sabido o enredo acerca da compra de parlamentares para aprovarem a PEC, com o intuito de manter no poder o então presidente, FHC. Provas fartas já à época. Mas há o fecho. O próprio FHC, em uma de suas colunas no jornal "O Globo", em 2012, admite que a compra de votos ocorreu. Fosse o personagem dessa história um metalúrgico, e não um nobre intelectual, achaques tirânicos aos montes.

Assunto mais que repisado na classe média e elite. Corrupção PT! Não só pela intensidade, mas sobretudo pelo monopólio exercido pelo PT neste aspecto, os conhecidos Petralhas. Asco! Fartos que são os casos de corrupção que atingem todos os partidos da ordem, PT inclusive, mas não só. Dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostram que, nas eleições de 2012, 317 candidatos a prefeito tiveram suas candidaturas barradas pela lei da ficha limpa. O PSDB liderou o ranking com 56 candidatos ficha suja, seguido por PMDB (49), PP (30), PR (25) e PSB (23). O PT aparece em oitavo, com 18 barrados, o que não é nada laudatório, mas vale a título de comparação.
Vem do mesmo TSE o ranking dos partidos com mais parlamentares cassados desde 2000. DEM ocupa a dianteira com 69 políticos cassados, o que dá  20,4% de seus parlamentares. Depois vêm PMDB (66 e 19,5%) e PSDB (58 e 17,1%). A partir dai, os números caem bastante, com PP (26 e 7,7%), PTB (24 e 7,1%), PDT (23 e 6,8%), PR (17 e 5%), PPS (14 e 4,1%), PT (10 e 2,9%), PPB (8 e 2,4%), PSB (7 e 2,1%), sendo que todos os restantes apresentam menos de 1%.  O PSOL não tem nenhum parlamentar cassado no período. Publicidade e estardalhaço, nestes casos, pra quê?

Petrobras. Reerguida, pujança sob o governo Lula. Atravessa problemas, relevantes. Que decorrem de verdades ditas, sim! Mas não só. Vejamos o caso da refinaria de Pasadena. Há muitas nuanças. As coisas não são tão simples quanto a conta U$1,2 bilhão menos (-) U$42,5 milhões, exaustivamente repisada pela mídia e pela sociedade, sugere. Não são tão simples pois as contas não são essas. Segundo Adriana Salles Gomes, editora chefe da HSM Management, e o jornal Valor Econõmico, entre outros números, ressalto que os belgas a compraram por um valor bem baixo, os U$42,5 milhões falados, pois assumiram uma dívida líquida da refinaria de cerca de U$200 milhões, da qual já haviam pago boa parte quando da venda de metade dela para a Petrobras.
Em resumo, a Petrobras comprou a refinaria inteira por U$486 milhões, mais U$386 milhões por custos judiciais, multas e tributos, decorrentes da briga judicial entre as sócias, e mais U$320 milhões pelos estoques de petróleo. Ou seja, entre outros ardis, se contabiliza compra de estoque como valor pago pela compra da refinaria pura e simples.
Nessa história toda, no entanto, há um detalhe que diz mais que números. À época, caras do "Deus" mercado, como Jorge Gerdau Johannpeter, dono da Gerdau, e Fabio Barbosa, ex-presidente do Santander e da Febraban e atual presidente do Grupo Abril, que edita o panfleto "Veja", faziam parte do Conselho de Administração da Petrobras e votaram a favor da compra da refinaria de Pasadena. Curioso, não? Por que a família Civita não questiona seu mais alto executivo? Irá esperá-lo afundar seu império, assim como ela sugere, cooperou para fundar a Petrobras? E o senhor Gerdau, por que não é procurado pela mídia para dar sua versão dos fatos?
Como se vê, há mais do que a maquiagem que nos é oferecida sobre o caso. Quem tiver maior interesse, recomendo ler este artigo: http://terramagazine.terra.com.br/blogdaadrianasallesgomes/blog/2014/03/27/o-episodio-da-petrobras-em-pasadena-e-o-ponto-de-vista-do-gestor/
Diante disso, traço um paralelo. Temos 20 anos de governos tucanos no Estado de SP. O sistema metroviário/ferroviário é pífio. Motivo suficiente para críticas, ou não, se o cidadão acha que tá bom. Só que não pára por ai. Novos fatos, quais sejam, escândalo dos cartéis do metrô e da CPTM emergem. Quer dizer, novos não, bem conhecidos da justiça Suiça, com condenações, há tempos. Segue. Capas e mais capas de revistas trazem à baila envolvimento de políticos graúdos, provas também. Espanto! Os arautos da honestidade, que inundam redes socias com compartilhamentos odiosos contra o governo federal e o PT, se calam. Por quê? A indignação é uma pantomima?

Tributos. O PT é o partido dos impostos e das taxas. Assim a classe média vocifera. Quem não se lembra da alcunha "Martaxa"? Pois bem, o governador Alckmin acaba de criar 27 novas taxas, a maioria em serviços ligados ao DETRAN. Me parecem coerentes. Coerência que os críticos contumazes de novos ou majorados tributos por determinados governos parecem não ter, pois neste caso não vi nenhum questionamento. Também houve aumento de taxas já vigentes. Os aumentos variam de 8% a eloquentes 133%. No aguardo das repercussões.

Há também atitudes intelectualmente desonestas, como atribuir certos acontecimentos ao governo Dilma, por exemplo, sem que ela tenha competência no caso. Lembremos, somos uma federação, os entes federados têm autonomia e determinados assuntos são de responsabilidade do Estado ou do Município, nos quais, obviamente, há governos de todos os partidos, petistas inclusive.
Para ilustrar, cito uma manifestação de uma conhecida, moradora de bairro nobre da cidade de São Paulo, ironicamente questionando a presidenta por ter faltado luz no seu bairro. Alô, Eletropaulo?? Estarrecedor! E tem estudo, faculdade, boa condição financeira. E escutar que os pobres votam no PT  porque são ignorantes. Bem, me parece que a ignorância atinge os eleitores de todas as correntes ideológicas, classes sociais e escolaridade, então.
Casos similares se repetem aos montes, como ocorre com a educação, que tem seus problemas atribuídos única e exclusivamente ao governo federal, sendo ser, entretanto, o ensino  infantil de responsabilidade dos Municípios, o fundamental e médio dos Estados e o superior da União. É óbvio que o governo federal tem responsabilidades e atribuições que influenciam todos os níveis educacionais, porém, repito, Municípios e Estados, como em todos os assuntos que são de sua responsabilidade, têm autonomia.
 Ou seja, o presidente da república não é o super-poderoso que pode tudo e, consequentemente, qualquer problema a culpa é sua . Isto se chama Estado autoritário, ditadura, do qual muitos críticos da esquerda têm saudades, saudosos que são da ditadura. Quero deixar claro, aos que têm dificuldade de interpretação, que o governo federal é responsável por muitas coisas, mas não todas! Mudamos, pois.

Para não dizer que falei só do PSDB e do PT, questiono. E o herói do panfleto Veja, senhor Demóstenes Torres, do DEM, tratado como exemplo de homem público pela publicação dos cães ferozes Civita, onde está, após o escândalo o envolvendo ao bicheiro Carlinhos Cachoeira? Está livrinho da silva, recebendo seu belo subsídio de procurador e passeando em Florença com sua esposa em lojas caríssimas. Imagine se fosse o Dirceu, meu caro, o estardalhaço que a Veja faria, que no caso do Demóstenes, seu parceiro, se cala.
E o ex-governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, filiado ao filhote da ditadura, DEM, em 2009, quando do escândalo do mensalão do DEM no DF, e hoje filiado ao PR? Está livre para se candidatar a governador do DF, e assim o fará.

Enfim, o discurso da corrupção é, por assim dizer, corrupto! Seletivo a mais não poder. Tem origem no preconceito e no recalque de quem rejeita uma mínima sinalização que seja de alteração do "status quo". A súcia conservadora, reacionária, também existe, e como. Dissimulada aos tubos.

O PT não é exemplo de candura, longe disso. Mas a criminalização do partido, o ódio nutrido pelos estratos sociais mais elevados como se tudo que acontece em nosso país é culpa dele e só ele é corrupto, é insano, desonesto.
Lembro que grande parte das investigações de corrupção, seja da situação ou da oposição, sem distinções, são obra da Polícia Federal, órgão ligado ao executivo federal e imensamente fortalecido pelo governo Lula.
A Controladoria Geral da União, então, faz um belíssimo trabalho de controle interno federal. Já li diversas denúncias de irregularidades do executivo federal pela CGU. E ela foi criada, vejam só, pelo ex-presidente Lula em 2003. Mais uma vez, como a PF, também é órgão ligado à estrutura de quem ela fiscaliza. Não por acaso, o prefeito Haddad criou a Controladoria Geral do Município logo que assumiu a prefeitura de São Paulo e os resultados positivos logo foram vistos, como no caso da máfia dos fiscais do ISS, que atingiu políticos de oposição e um secretário do governo Haddad, que se afastou do cargo.
Gostaria de entender como alguém tão corrupto CRIA e fortalece instituições que têm o condão de controlá-lo e investigá-lo, sobretudo no caso da CGU, que nem existia.
Ah, e o procurador geral da república, hein. No governo FHC o senhor Geraldo Brindeiro foi nomeado em 1995 e reconduzido três vezes ao cargo, no qual ficou ininterruptamente até 2003. Este PGR ficou conhecido como engavetador geral da república, pois dos 626 inquéritos criminais que recebeu, engavetou 242 e arquivou outros 217. Somente 60 denúncias foram aceitas. Entre as denúncias que engavetou está a de compra de votos para a aprovação da PEC da reeleição, que favoreceu FHC.
Já nos governos seguintes, os PGRs puderam e podem realizar seus trabalhos de forma independente.
Enfim, atualmente, denúncias de corrupção pululam pois, entre outros motivos, não ficam embaixo do tapete.  

A corrupção não é monopólio deste ou daquele governo ou deste ou daquele partido por um motivo muito simples. Ela não é fruto só de comportamentos morais desviados, mas, sobretudo, resulta do atual sistema político e econômico, do qual os conservadores, mais uma vez, são seus maiores defensores. Lutam o quanto podem contra o financiamento público das campanhas e a favor do financiamento de grandes empresas nas eleições, este último a mãe de todas as corrupções. E depois posam de defensores da probidade. Abjetos, isto que são.

Por fim, peço licença ao jornalista Flavio Gomes (1) e ao escritor Luis Fernando Veríssimo (2),  para finalizar meu texto com citações que exemplificam como a mídia e a sociedade tratam de forma desigual os desvios de conduta políticos, desigualdade que é retrato da nossa desigualdade social:

(1) " Tudo que é PT é escândalo e culpa-se diretamente suas lideranças. Tudo que é PSDB é tratado como desvios de conduta que suas lideranças desconheciam".

(2) "Proponho o fim da hipocrisia no julgamento de casos de corrupção no Brasil. Oficialize-se já dois sistemas de pesos e medidas diferentes. Um que só vale para o PT. E outro para os outros, principalmente o PSDB."